quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Inteligência Emocional

Da próxima vez, você vai chegar e eu vou estar sem palavras: já não sei mais o que dizer disso que somos nós. Fiquei tentando desde a última vez que nos vimos não pensar e não sentir e arrumei lá dentro de mim uma gaveta pra você, mas não tirei suas fotos da geladeira. Mesmo assim, a parte mais profunda ficou lá na gaveta, que eu só abria para dar uma olhadinha de vez em quando.
Anyway, a intenção era levar a vida como se você não existisse: viver, de verdade, e não viver estando a sua espera o tempo todo. Aí fiquei me perguntando o que eu iria, de fato, deixar a vida fazer comigo pressupondo que você não faz parte dela no dia-a-dia. E também me perguntei se de fato iria deixá-la fazer alguma coisa, como se eu, e não ela, tivesse as rédeas do jogo. Comecei a tentar configurar minha vida sem a sua presença em todos os segundos, em todas as coisas, em todos os textos, em todas as vontades, em todas as músicas. Assim, de forma bem racional e serena: do jeito que eu quero ser quando crescer. Você existe, sim, fico muito feliz por ter: primeiro, encontrado você e segundo, descoberto você em mim. Mas, você está aí e eu estou aqui, e a vida continua: bela, dolce, rose. O jeito é conviver com a falta que você me faz de um jeito, de novo as palavras bonitinhas, racional e sereno: um jeito que não dôa. Inteligência emocional, Samara, ISSO que fez tanta falta a sua vida inteira. E eu, inteligentíssima emocionalmente, tranquei a sua gaveta à chave: para não ficar abrindo a toda hora que me sentisse ou isso ou aquilo e que venha a vida. Isso, menina, é assim que se faz: parabéns, assim você vai longeeeeeeeee. E como fui, menino. Você nem queira saber!
Minha decisão inteligente durou horas intermináveis, suficientes para me esvaziar quase que por inteiro. Por menos inteligente que isso seja, eu permiti que você fizesse trabalho de formiguinha em mim e preenchesse cada espaço: sentir sua presença me enche de desejo e de esperança. Quem teve as rédeas desde o início senão a vida e não eu? Não sei ficar sem você. Mesmo à distância. Adeus, inteligência emocional. Adeus, serenidade. Cá estou eu novamente: explodindo, em carne viva, desvairada, tsunâmica, emocional e… Burra.

(Samara)

E agora, Seu Dé?

Há treze anos morreu uma das pessoas mais importantes da minha vida. Talvez a mais importante: meu pai. No dia 8 de outubro de 1995, minha mãe gritou pela janela do sobrado: Não dá mais tempo. De lá pra cá esse dia sempre me marcou. Não poderia dizer que há treze anos perdi a pessoa mais importante da minha vida porque uma pessoa como ele não se perde: só se ganha, mesmo quando vai embora. De qualquer forma, quando eu tinha 13 anos (hoje estou fazendo contas! E isso é muito estranho pra mim, que prefiro sempre "fazer de conta" - risos) ganhei um Concurso de Poesias com uma poesia chamada Esquina da Lua. Preciso resgatá-la em algum lugar do passado, como tenho resgatado tantas outras coisas. O mais importante desse dia, fora a minha timidez ao subir no palco para receber o prêmio, foram as lágrimas do meu pai que, emocionado, tentava contê-las a todo custo sem muito sucesso. Ele era chorão, como eu. Mas eu aprendi a não conter lágrimas.
Não por acaso hoje começo a escrever meu blog. Que é uma homenagem a ele. Com todo o amor que há em mim e muitas saudades.
(...)
Mas lá estava ele, primeiro, único, univitelino, respirando sua boca, seu pescoço, seus seios, seus sonhos, seus medos, suas coxas semi-abertas, seu passado, seu presente e seu futuro. Ela fica sem saber se se entrega ao sono, a ele ou à morte. Aquilo era morrer? Ser respirada e não respirar? Ele respira seu nariz, respira sua respiração, sorve todos os seus líquidos sem dizer palavra, virando-a de costas e do avesso para inspirar todos os milímetros dela, abrindo delicadamente caminhos quando é preciso. Quase nunca é, uma vez que, para ele, ela abria-se inteira, despetalada: dormindo ou não, viva ou não. Ele sabe de cor cada segredo desse labirinto. E ela vinha de si em etapas, em ondas, em medos, à deriva jorrando-se toda na boca daquele homem que a salvava de ser só para ela. Ele sabia também, e isso era segredo dela, todos os acordes desse abismo. A paixão é sempre uma covardia.
Beatriz amanhece com os pulsos atados à cabeceira da cama. Queria tantooooo desatar aqueles laços, queria tanto livrar-se daquela onipresença insistente em todos os seus domínios, queria tanto apagar todos os rastros daquilo tudo tão tanto em si mesma, mas não conseguia. Simples assim. Não conseguia. Conseguiria um dia? Beatriz possuída. Esses nós a prendiam toda noite à cabeceira da cama – não importa com quem ela houvesse se deitado e mesmo que ela não houvesse se deitado com ninguém – e era ele, sempre ele, exclusivamente ele, inacreditavelmente ele – quem apertava os nós.

(Samara Sieber)