Eu amanheceria com você muitas outras vezes porque teria certeza de que a vida seria mais delicada pelo simples fato de você estar ali. Todas as coisas corriqueiras seriam ainda mais especiais – mesmo que não fossem. Ensolarar-me-ia pela manhã só para você por todas as manhãs que você permitisse.
Também engravidaria, sem medo e com uma emoção incomensurável, numa manhã de Sol. E amanheceria uma mulher muito maior do que todas as outras do planeta já que, afinal de contas, particularmente em mim se faria o processo mais que perfeito de uma existência: a vida. Você teria, afinal, o melhor de mim porque certas coisas minhas são naturalmente suas, sabe-se lá Deus por que. E eu não sei exatamente o que fazer com isso, a não ser tentar aceitar.
Eu também entardeceria com você e deixaria o Sol se pôr em mim à vontade, porque a poesia da vida estaria mais, muito mais, óbvia. Largada solta, leve e, o que é melhor, despretensiosa, em um diálogo qualquer de fim-de-tarde. Comigo mesma ou com você. Ou ao mesmo tempo com os dois. (Me entendo tão mais quando converso com você – sei, de repente, não apenas o que sou como também o que seria capaz de ser)
E seria fatalmente poesia correndo solta nas veias, destravada, deslavada, desvairada e madura - já que teria alguém para respirá-la junto comigo a cada batida de coração. Às vezes, é tão penoso o esforço de ter que explicá-la para alguém (de quem cobramos, sem querer e com uma quase covardia, todo o entendimento) que é melhor deixá-la menos evidente, menos latente, menos inteira. Calá-la um pouco para viver melhor. Ou, melhor, conviver. (Entardeceria impregnada de luz e de poesia e seria uma mulher muito mais forte também porque, afinal de contas, não gastaria a energia que preciso gastar habitualmente para me fazer entender.)
Entardeceria cheia de amor por todas as coisas vivas, visíveis ou não, porque a vida é, afinal, tudo de bom e excitante em todo o seu incomensurável mistério.
Eu anoiteceria com você de novo e sempre e faria da noite minha cúmplice desordenada de ser, aqui e ali e diariamente, uma outra mulher qualquer, nunca experimentada, inventada e reinventada tantas vezes quantas fossem desejadas por você. Mudanças inspiradas, por exemplo, pelas fases da Lua ou em qualquer outra desculpa simplesmente pelo fato de colocar-me exposta para decifrar. Sentir-me-ia devorada e desvendada e isso, sim, é o melhor que uma mulher pode querer da vida. Seria uma mulher daquelas que aprendem definitivamente a pular do abismo e a sair voando por si mesmas pela simples poética de serem feitas de substantivo feminino.
Da madrugada traria, talvez, o meu momento mais humano e menos feminino... A tentativa em nada obscena de deixar à tona um ser humano quieto, calmo e sereno, pelo menos de vez em quando, pela simples dádiva de ser inteiro. Para isso, seria, claro, necessário e imprescindível aprender o equilíbrio, domando, com razão e sensibilidade, intensidades e outras coisas também, para fazer nascer, finalmente, somente e simplesmente, um ser humano inteiro.
(Ressuscitaria muitos tigres que morreram dentro de mim, para, então, libertá-los. Inclusive de mim.)
Presente do Indicativo
Eu quero você e ponto. É isso o que eu sei.
Mas descubro, tentando entender com serenidade, que a vida é, também, a arte do desencontro.
(Escrito há alguns anos, para uma pessoa para sempre.)
segunda-feira, 17 de novembro de 2008
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